segunda-feira

19 DE ABRIL, DIA DO ÍNDIO

19 de Abril Dia do Índio
Por onde anda a triboTabajara?

Os tabajaras são um povo indígena brasileiro que habita o estado do Ceará, nos municípios de:
•Crateús (aldeias: Nazário, Vila Vitória, Maratoã, Altamira),
•Poranga (aldeias: Jardim das Oliveiras, Jericó, Cajueiro e Calumbi),
•Quiterianópolis (aldeias: Fidélis, Croatá, Vila Nova e Alegre),
•Monsenhor Tabosa (Olho d'água dos Canutos) e
•Tamboril (Grota Verde).

O etnônimo tabajaraO etnônimo tabajara é uma das muitas armadilhas que a historiografia colonial deixou como herança para a etnologia brasileira. Registrado em diversos lugares e períodos diferentes, a correlação entre o nome e um grupo específico é muito tênue e pode nos trazer mais problemas do que soluções. Desse modo, preferimos operar seguindo a idéia de que este termo seja muito mais uma adscrição classificatória, utilizada em contextos delimitados, do que um grupo substantivamente definido. Inclusive, esta parece ser a direção corrente na literatura antropológica atual.Segundo Fausto, (1992, p.384, 385 e 391) o termo Tobajara, era uma categoria classificatória dos povos tupi que servia para denominar aqueles grupos com os quais podiam estabelecer relações de reciprocidade ou de guerra alternadamente, advindo daí a sua dupla tradução como cunhado e inimigo.Tentamos, neste ponto, desnaturalizar as idéias a respeito de uma suposta unidade e diferenciação indígena em grupos bem delimitados e segmentados, que estaria representada em seus etnônimos. Pois, “Longe de ser uma profunda expressão da unidade de um grupo, um etnônimo resulta (geralmente) de um acidente histórico, que freqüentemente é conceitualizado como um ato falho, associado a um jogo de palavras e com efeito de chiste” (Oliveira, 1999, p.172. Parênteses nossos). Ainda mais nos casos dos encontros e desencontros coloniais, nos quais os jogos de interesses e as guerras provocavam constantes mudanças sociais, com grupos se fragmentando, se reunindo e mudando de lado . Por isso, nesta análise histórica optamos por tratar do etnônimo tabajara e não da etnia Tabajara, evitando reificar eventos e menções que talvez tenham existido apenas no momento da escrita colonial e que não correspondiam às divisões correntes entre os indígenas.De acordo com Silva (2003) os termos Potiguara, Tabajaras e Caetés, que aparecem nas crônicas coloniais de Pernambuco têm mais a ver com posições assumidas pelos grupos indígenas na relação com os colonos portugueses do que com divisões estanques entre os grupos, podendo estes mudar de nome de acordo com as mudanças nas alianças políticas
Com um histórico de alianças com os portugueses, os Tabajara são “leais”, “valentes”, “fortes”, com ações de tanto valor, destreza, ousadia e esforço. A conversão para a fé católica também é apresentada como um ingrediente a mais no diferencial em relação aos outros grupos, e por fim, a referência aos “capitães heróis”, desde o tempo de Duarte Coelho, completa a construção da figura mítica para o grupo.(2003, p. 35).Esta variedade de denominações é comum na literatura histórica e antropológica, onde a depender das fontes, os grupos aparecem grafados de diversas maneiras e até com dois ou três nomes diferentes. Assim, muitos autores utilizarão o termo Tupinambá para designar o conjunto de povos de língua tupi (esta também chamada de tupinambá antigo, cf. Rodrigues, 1986) que vivia no litoral entre Cananéia/SP e o Ceará, tendo daí migrado para a Serra da Ibiapaba, o Maranhão, o Pará e a ilha Tupinambarana, no rio Amazonas.Ao descrever as migrações dos Tupinambá, Caeté e Potiguar do litoral de Pernambuco e da Bahia para o Maranhão, Fernandes (1989), argumenta que ao fugirem dos portugueses que ocupavam estas regiões, estes grupos se aliaram e no trajeto percorrido a partir de 1570-72, ocuparam diversas áreas do interior e litoral
“A composição dessas migrações é perceptível na distribuição dos emigrantes nas terras do Maranhão e do Pará, conquistadas aos Tapuias, seus antigos senhores. Os Tupinambá abandonaram a zona do Ibiapaba, e localizaram-se na Ilha do Maranhão. Os Potiguar continuaram a viver ali. Em virtude do rompimento dos laços de solidariedade, os dois grupos tribais tornaram-se inimigos designando-se reciprocamente como Tabajara.” (1989, p. 43, grifos nossos)
Em virtude disso, os grupos que se fixaram na serra da Ibiapaba ficaram conhecidos nos registros históricos como Tabajara. Nesta região, viviam ainda inúmeros grupos tapuias, tais como Tacarijú, Quitaiaiú, Ocongá, Caratiú, Reriiú (Areriú), Acriú, Anacé, Aconguassu (Acoanssu), que eram de certa foram subordinados aos Tabajara. Ainda no século XVII, após as invasões holandesas, centenas de índios Potiguara da Paraíba e Pernambuco, convertidos ao calvinismo, buscaram refúgio na Ibiapaba, até então, uma área livre do controle português.No século XVIII quando os padres jesuítas conseguem finalmente instalar uma missão na serra da Ibiapaba esta vai ser composta por uma variedade de etnias indígenas, muitas vezes citadas na documentação como Tabajara (Cf. Barros, 2001). Essa população aldeada vai sendo incorporada ao projeto colonial paulatinamente, destacando-se a sua utilização como mão-de-obra agrícola e fornecimento de tropas para combater índios rebeldes e invasões estrangeiras. A associação entre o etnônimo Tabajara e as populações nativas da serra da Ibiapaba vai se costurando nesse processo, de modo que, nos séculos seguintes serão tratados em muitos textos quase como sinônimos. Com a elevação das aldeias missionárias à categoria de vilas de índios a partir de 1759, registra-se na capitania do Ceará uma grande dispersão dos índios aldeados, em virtude das novas condições de trabalho, ditadas pelos diretores civis que substituíam os padres (Porto Alegre, 1992, p. 203-208). Na Ibiapaba, as aldeias missionárias constituirão as vilas de Viçosa, São Benedito e Ibiapina, que serão registradas como lugares habitados por índios até o século seguinte (Porto Alegre, 1992; 2004).A dispersão da população aldeada tenderá a se acentuar ao longo do século XIX, com os inúmeros conflitos sociais do primeiro império, quando registra-se a deserção de 60 casais da Vila Viçosa para participar da Balaiada no Maranhão. Durante o segundo império, as aplicações da lei de terras e a extinção dos antigos aldeamentos irão provocar a invisibilização completa da população indígena na província do Ceará. É neste momento que são referidas as últimas notícias com relação ao etnônimo Tabajara e/ou aos índios da serra da Ibiapaba, precisamente em notícias de viajantes e expedições científicas (cf. Porto Alegre, 2003).São esses processos que irão acelerar a dispersão da população indígena em pequenos grupos familiares em busca de alternativas de sobrevivência em terras devolutas ou sob a proteção de algum proprietário. Essa busca se dará especialmente nas zonas fronteiriças e ainda não ocupadas, como a região sul da Ibiapaba (Crateús), trocada no final do século XIX, pelo Piauí em favor de uma saída para mar, representada pelo porto de Parnaíba, até então pertencente ao Ceará.Os Tabajara possuem uma história de sucessivas migrações, devido a constantes conflitos de terras. Os Tabajara que vivem em Crateús são provenientes das serras vizinhas, principalmente a serra da Ibiapaba, e tiveram que migrar para a periferia da cidade, foragidos da opressão exercida pelos fazendeiros que invadiram suas terras. Dividem-se em sete comunidades. Recentemente, um grupo de 15 (quinze) famílias dos Lira, migrou para a cidade de Quiterianópolis, onde encontraram melhores condições para viver, de acordo com seus costumes indígenas. Ficaram conhecidos como os Tabajara de Fidélis. Nesta mesma cidade encontram-se mais 3 (três) comunidades Tabajara: Vila Nova, Croatá e Vila Alegre, todas na área rural.
Mapa indicando a presença indígena contemporânea no Ceará. Fontes: FUNAI e FUNASA.
Em fevereiro de 2004, os Tabajara de Crateús conseguiram, através de sua luta, retomar cerca de 6.000 hectares de sua terras que ficam na serra da Ibiapaba. O local é chamado de Nazário e lá estão residindo cerca de 10 famílias, entre Tabajara e Kalabaça, enquanto aguardam a delimitação e demarcação da terra.
Em Monsenhor Tabosa se encontra a comunidade Tabajara de Olho d`água de Canutos, há 4 km desta cidade. São 13 famílias residindo na região. Em 1973 a família Canuto, liderada por Seu José Canuto, comprou 74 hectares de terras onde antes viviam como moradores. Organizam-se através da Associação Unidos Venceremos do Povo Tabajara de Olho D´água de Canutos, que se reúne no salão comunitário da Escola Indígena da comunidade. Em Tamboril existe a comunidade Tabajara em Grota Verde , à 35 quilômetros da cidade. São 25 famílias que se organizam através de uma associação sob a liderança de Agno Tabajara. Atualmente, sofrem constantes ameaças por parte de fazendeiros, fato que tem limitado suas ações políticas.Os tabajaras de Poranga residem na Aldeia Imburana, que fica próxima à cidade e também na Aldeia Cajueiro, distante 38 quilômetros de Imburana. Esta aldeia, de 4.400 hectares , foi fruto de uma retomada, sendo hoje habitada por 9 famílias, entre Tabajara e Kalabaça e igualmente aguardam a regularização da terra indígena.Entre suas instituições, existem o Conselho Indígena dos Povos Tabajara e Kalabaça de Poranga - CIPO, importante instrumento de organização e luta; a Associação de Mulheres Indígenas Tabajara e Kalabaça (AMITK) e a Escola Diferenciada Indígena de Poranga.
População e localização atualDe acordo com o Distrito Sanitátio Especial Indígena do Ceará (órgão da Fundação Nacional de Saúde), os Tabajara no Ceará compõem uma população de 2982 pessoas, assim distribuídas:
Crateús - 889 pessoas
Poranga - 1175 pessoas
Monsenhor Tabosa - 443 pessoas
Tamboril - 113 pessoas
Quiterianópolis - 362 pessoas
Etnia indígenas mais populosas no Leste-Nordeste.
Fontes:
DANTAS, Beatriz Gois et. Alli. “Os Povos Indígenas no Nordeste Brasileiro: Um Esboço Histórico.” In, CUNHA, Manuela Carneiro da. (org.) História dos índios no Brasil, 2ª ed., São Paulo: Cia. Das Letras/ Secretaria Municipal de Cultura/FAPESP, 1998, pp. 431- 456.
OLIVEIRA, João Pacheco de (org.) "Uma etnologia dos 'índios misturados': situação colonial, territorialização e fluxos culturais." In, OLIVEIRA, João Pacheco de (org.). A viagem da volta: etnicidade, política e reelaboração cultural no Nordeste indígena. Rio de Janeiro: Contracapa. 1999. pp. 11-41.
PORTO ALEGRE, Maria Sylvia; MARIZ, Marlene da Silva; DANTAS, Beatriz Gois (Orgs.). Documentos para a história indígena no nordeste : Ceará, Rio Grande do Norte e Sergipe. São Paulo : USP-NHII/FAPESP, 1994. 269 p.
PORTO ALEGRE, Maria Sylvia. Aldeias indígenas e povoamento no Nordeste no final do século XVIII : aspectos demográficos da "cultura do contato". (Trabalho apresentado no GT "História Indígena e do Indigenismo", no XVI Encontro Anual da ANPOCS, Caxambú-MG, 1992).
______.Comissão das borboletas. Fortaleza: Museu do Ceará/SEC. 2003.
SILVA, Robson Cândido da. Relatório de levantamento preliminar das terras a verificar no estado do Ceará. FUNAI: Brasília. Digitado. Setembro de 2004.

Desenvolvimento pela cultura

Estatísticas mundiais mostram que durante a última década as indústrias culturais – termo criado por Adorno e Hokheimer, expoentes da Escola de Frankfurt, que designa toda a produção cultural destinada ao consumo – ganharam espaço nas agendas políticas, por conta de sua evolução contínua como fonte de geração de renda e de empregos. Em diversos países, a Economia da Cultura chega a ser responsável por boa parcela do PIB, mostrando que a união entre desenvolvimento e cultura, para além de possível, é rentável. E o que até então parecia ser uma realidade restrita a países ricos, começa a despertar o interesse de regiões em processo de desenvolvimento, porém possuidoras de um vasto patrimônio cultural. No Brasil, o tema ainda não ganhou o devido peso, iniciando o processo de migração dos bancos acadêmicos para o dia-a-dia. No entanto, ainda existe muita confusão em torno do conceito.
Por isso, antes de entrar na questão será preciso considerar o conceito de Economia da Cultura. O termo abarca o setor econômico e simbólico da cultura, como a arte, o folclore, o artesanato, a indústria cultural, o patrimônio material e imaterial, e envolve produção, circulação e consumo de produtos e serviços culturais. Outro cuidado a ser tomado diz respeito à diferenciação entre Economia da Cultura e Economia Criativa, sendo esta última mais abrangente, o que inclui também o esporte, o turismo, a propaganda, a moda e a arquitetura, entre outros. Para uma ideia mais concreta, em 2006, o IBGE publicou, em parceria com o Ministério da Cultura, uma pesquisa com indicadores culturais que revelava que a Economia Criativa já respondia por 7% do PIB mundial, tendo os produtos culturais como principais itens da pauta de exportações dos Estados Unidos e representando 8% do PIB da Inglaterra à época.
Porém, como afirma a administradora pública, economista e autora do livro Economia da cultura e desenvolvimento sustentável – O caleidoscópio da cultura, Ana Carla Fonseca Reis, é delicado tomar esses indicadores como base, pois, como eles fazem parte de uma média, não refletem um setor em especial, mas a junção de vários deles. “Se formos partir para uma análise mais profunda, deveremos levar em consideração, por exemplo, processos inerentes à era digital, como a capacitação de softwares, o processamento de dados, as telecomunicações e a internet, que também compõem os quadros da Economia Criativa. É prematuro concluir que a cultura como entendemos cresce mais que os outros setores da economia”, explica.
Reis afirma que, atualmente, a globalização se tornou um paradoxo. Ao passo que o mundo fica com fronteiras cada vez mais tênues, as pessoas temem a diluição de suas identidades e buscam raízes num processo em que o local reforça o global. “O mundo está deixando de ser linear. Há um processo de aceleração da padronização de produtos e serviços. No ramo do turismo, por exemplo, o fluxo de turistas de negócios e de lazer tem crescido e estima-se que, em 2025, 1,6 bilhão de pessoas estarão viajando, transmitindo sua cultura e tendo acesso a outras. Mas essas pessoas não buscam algo padronizado; desejam o diferente, o singular, o local, e não o global”, diz. Para embasar sua fala, a administradora pública cita um conceito do economista indiano Amartya Sen, vencedor do Prêmio Nobel de Economia de 1998, que diz que “o desenvolvimento requer a expansão de liberdades de escolha, ou seja, não basta ter um resultado final, a pessoa deve ser capaz de pensar no processo consciente de decisão, como o voto e até o consumo consciente”. E completa: “o problema é que há gente interessada em trabalhar com cultura, mas muitos o fazem de maneira pontual ou militante, já que a atividade não é devidamente remunerada, além de não haver um processo eficiente de distribuição do material produzido. As tecnologias digitais mudam essa questão, possibilitando um fluxo maior de distribuição e difusão”. Reis afirma que o investimento em tecnologias e produtos locais é um importante fator de diferenciação. “Para o desenvolvimento local é preciso preservar e fomentar os fazeres e saberes regionais que correm o risco de extinção, uma vez que para sobreviver muitas pessoas migram para outras cidades, perdendo o contato com sua cultura de origem”.
No âmbito global, Reis explica que ainda falta um índice que mostre o repasse de oportunidades. “O mundo cresce, mas o desenvolvimento não ocorre. Há discussões que apontam o investimento em criatividade como a solução para o desenvolvimento. E há países que trabalham visando esse objetivo, apostando em educação e capacitação. Pode-se dizer que adotar uma estratégia relacionada à cultura e à criatividade seria uma forma profícua de conquistar desenvolvimento, uma vez que esses dois elementos existem no mundo inteiro”.
É nesse cenário que estão inseridos o poder público e a iniciativa privada voltados para a Economia da Cultura. “O poder público deve fazer política cultural de conteúdo objetivo e claro, de forma transversal, mesclando ações de turismo, educação e desenvolvimento. Mas isso vem regredindo no Brasil pois as alianças de extremas esquerda e direita não se falam, o que dificulta o trabalho em conjunto. Devemos tomar como exemplo os trabalhos feitos em Bogotá, Bilbao, Medellín, Londres, que hoje têm continuidade e visibilidade no mundo. Nesse sentido, a pergunta a fazer é: como adotar um modelo de investimento a longo prazo no Brasil se não há continuidade? Temos um histórico de falta de investimentos em questões estruturais como a educação, sendo que quando há alguma ação, esta valoriza a quantidade em detrimento da qualidade. Com relação ao setor privado, acredito que já é hora de começar a ver a cultura como investimento e não como gasto”, diz Reis.
Para o pesquisador da Unicamp e autor do livro Arte, Privilégio e Distinção, José Carlos Durand, a educação cumpre um papel fundamental para uma orientação direcionada à cultura: “Por mais que se critique a qualidade da educação no Brasil, a inclusão escolar que estamos vivenciando a passos largos é muito auspiciosa como pré-requisito para o incremento da vida cultural a médio e longo prazos”, afirma. Nesse sentido, o avanço tecnológico da mídia digital é apontado por ele como um fator de barateamento da cultura para o consumidor final, o que colaboraria para o desenvolvimento da Economia da Cultura do País. “É um barateamento também para o artista iniciante, que pode preparar uma matriz – um disco, um livro – sem sair de casa. Com isso, produz os exemplares necessários para tentar se lançar”, conclui.
A economista Ana Carla Fonseca Reis acredita que um investimento contínuo em cultura, do ponto de vista simbólico e identitário, “levaria os seus diversos agentes a tratar a questão de forma séria, o que se desdobraria em estatísticas periódicas e políticas integradas. Acho que o Brasil tem tudo para desenvolver uma forte Economia da Cultura”, finaliza.
Laís Nitta e Priscila Fernandes/ Blog Acesso